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segunda-feira, 23 de junho de 2008

Textos malditos para O Livro da Embriaguez


(Para Will. Museu do Ipiranga. Maio 2008. Por Rudinei Borges)
...esta casa amarela entre outras casas amarelas. O horizonte infindo é um concreto vago. Se pudéssemos comê-lo sentiremos um gosto amargo. Tudo nesta manhã é amargo. Menos o manequim dos biquínis roxos e a escada rolante vagarosa e rolante. Hoje, sou isto, amanhã aquilo. Não, eu sempre fui isto: um almoxarifado. O silêncio de domingo, o sino. Aquela senhora, interessante senhora do Ipiranga, ela come as unhas e o cabelo foi penteado às pressas. Aquela senhora olhou para mim. Não gosto que olhem para mim. Que olhem para as paredes, para o teto. Olhar para mim? Ah, que desperdício de energias. Um espelho? Para que serve um espelho quando não queremos olhá-lo? Talvez para recordar que um dia debaixo da porta houve uma carta e que as chaves são semelhantes aos chifres de Lúcifer. Um dia vi Lúcifer. Mas Lúcifer é imbecil e poeta. E eu não gosto de poetas. Aliás, o que tenho feito, senão odiado este recital trágico. Meu caro, Jude, a vida é perigosa como estas estátuas. Não duvide. Este homem que lê ler a si mesmo vagarosamente e amanhã deixará a saliva sobre os espectros. E este homem que escreve deitou-se com as algemas. Esta casa amarela. Meu Deus! Se você olhasse para mim. Mas não gosto que olhem para mim. Desconfio de mim que não durmo.

É interessante como me acusam. E é mais interessante como eu os acuso. Todas as manhãs sinto o aroma dos meninos de Sodoma, mas o meu coração é pequeno. Eu olho os pássaros como se olhasse os pássaros e sinto afeto como se sentisse afeto. Meu caro, há duas saídas sábias: ou escute estas frases ou escute estas frases. Eu não teria saco para isso. Talvez por isso tenha dormido tanto este tempo todo. Aos poucos busco alguma pequena razão neste soneto. E aos poucos fico animado quando leio algo verdadeiramente interessante. Porém, ler e escrever são um exercício para o próprio sepultamento. Eu não vou ao bar ou vou ao bar. Não sei se o sexo faz dessa carta um tratado valioso. Em verdade, quando faço sexo me sinto agraciado pela coragem. E o que pode um escritor com a coragem? Decerto, se eu não fosse um fracassado não escreveria merda alguma. A matéria deste negócio é o meu próprio flagelo.

Desista. O que importa, de fato, é o desejo abrupto e freqüente de sair às ruas e fazer sexo até sentir que a morte, enfim, está próxima. Eu sou o resumo de minha carência. O que faria com a iluminação? Acho que só há uma solução sábia e não duas: perdoa-me depois de cada frase ou sinta compaixão ou sinta amor ou venha fazer sexo comigo ou deseje os meus lábios ou chupe o meu pescoço ou vá para o inferno.

Naquela noite, então, deitei-me na grama como tenho deitado sempre. Já havíamos amontoado muitos gravetos e Deus havia feito uma fogueira admirável. Por isso, não senti frio. Tínhamos chá e tomamos. Também alguns lenços e fizemos mágica. Lemos todo O divã de Tamatit. Foram horas naquele recital. Restaram algumas brasas. Era escuro e devagar Deus acariciava os meus lábios. Não foi preciso esperar.

Toda noite uma janela fica com as lâmpadas ligadas naquele edifício. Quase não vejo ninguém e a música do meu despertador perdura em minha memória como se o despertador ficasse despertando o dia inteiro. Sim, eles retornavam de um sepultamento. Aquela manhã o sol estava quente. Mais à frente Camile caminhava com o guarda-sol aberto, enquanto Jean olhava os bichinhos entre as papoulas vermelhas. Jean ainda não entendia sobre enfermidades e sepultamentos. Creia, Camile retornava com um olhar entristecido. Aquela casa ao fundo era estranha. Não entendo. Eddie não gostava de casas grandes. Ele sempre foi tão comedido. Jude, acalme-se. Eu queria acordar com maior clareza do que aconteceu. Não tenho mesmo pretensões. Há uma coisa de culpa sempre. Eu não sou culpado. Sei, não careço de defesa.

É sufocante vê uma mulher como Camile chorar. Chorar é imundo. Eu sinto nojo de quem chora. Talvez por esta razão eu não sinta uma gota de amor por mim, nem pela humanidade. Não diga que estou mentindo. Amei. Sim, amei como um louco, como um bêbedo, como um cachorro, como uma puta, como um martelo, como um sapo, como um unicórnio, como um muro, como uma xícara, como uma pétala. Amei com um homem desesperado ama. Amei Franz Eddie e continuo amando Franz Eddie e continuarei amando Franz Eddie. Ah, é por esse motivo que me acusam ou é porque não suportam o cheiro de álcool no meu hálito. Tornei-me uma vergonha. Que mérito o meu. Eles estão preocupados comigo (cinismo). Pobrezinhos... Como gosto deles. Foi Godot que os enviou aqui? Acho que eu deveria citar Beckett esta carta inteira. Aliás, maldito Beckett que nasceu antes de mim. Faríamos um dueto romântico incrível. Ou não faríamos nada. Não fazemos nada quando desejamos fazer nada ou ao contrário. Tenho vontade de fazer xixi...

Eu organizei os versos e após o título citei o nome de ruas. Eu não sei o que li. Nos últimos meses não tenho lido nada. Apenas artigos, comentários, frases. Eu deveria tentar ler a Bíblia. Talvez o livro de Ezequiel, o Apocalipse. Ou os escritos de alguma religião oriental. Eu queria ler algo que fosse misterioso, mas que não fosse enfadonho. Estes livros com muita obviedade me deixam atormentados. Sou vagaroso até para escrever uma carta. Catherine não envia uma lauda sequer. Menos ainda Alfredo. O único que, com freqüência, lembra que eu existo é o nosso amado Lazzaro. Meu Deus, sempre com aquela revolta, sempre com aquela vontade de salvar o mundo. Disse-me que eu moro fora deste mundo e que o ostracismo é uma opção. Só um idiota quer salvar a humanidade. Ninguém em sã consciência acredita que há salvação para estes aglomerados de carnes que andam nas ruas. A falácia é uma virtude. Não posso esquecê-lo. Um dia àquele cárcere desprezível para visitá-lo. Ele ficou surpreso.

Cena I

Lazzaro: como você conseguiu fingir não está bêbedo estando (surpreso)? Um poeta deve acreditar na humanidade (convicto).

Ernesto: Meu caro, Lazzaro, entendo mais de sexo.

Cena II (...)

O que não sufoca? Não consigo organizar os argumentos. HgfjjKLnsdlj(dslalwfejklsjauiweub ssnm, naldhujqhdsjqbbkdppion-jiudmsniSL7(8uçpwjfddsffwçpieiufnc.m,ZTos esperam por horas. Talvez se eu os acusassem. Se eu disse que eles são os assassinos. De que adiantaria? Não tenho esperança de vê-lo. Acorde, por favor. Não durma. Por favor, não durma (com grande desespero). não não não não não não não não não não não não não não não não não não não não não não na
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Naquela noite, então, deitei-me na grama como tenho deitado sempre. Já havíamos amontoado muitos gravetos e Deus havia feito uma fogueira admirável. É sufocante vê uma mulher como Camile chorar. Chorar é imundo. Eu sinto nojo de quem chora. Cena XXII: 1801198318011983180119831801801198318011983180119831801198318011983180119831801198318011983180119831801198318011983180119831801198318011983180119831801198318011983180119831801198318011983180119831801198318011983180119831801198318011983180119831801198318011983180119831801198318011983 não não não não não não não não não não não não983180119831801198318011983180 desesperado ama. Amei Franz Eddie e continuo amando Franz Eddie e continuarei amando Franz Eddie. Ah, é por esse motivo que me acusam ou é porque não suportam o cheiro de álcool no13+12+134+897-7-8-54-56+654x(13+12+134+897-7-8-54-56+654)x(13+12+134+897-7-8-54-56+654)+{[(abcdefghijklmnopqrstuvxwy)]+z}x13+12
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sexta-feira, 20 de junho de 2008

Não sou alegre, nem triste: sou poeta.

quarta-feira, 18 de junho de 2008


O velho poeta Bukowski


"Eu não vou muito a bares. Tirei isso do meu sistema. Hoje, quando entro num bar, sinto náuseas. Freqüentei muito, enche o saco. Os bares servem para quando somos jovens e queremos brigar, dar uma de macho, arrumar umas mulheres. Na minha idade, eu não preciso mais dessas coisas. Agora só entro nos bares para urinar. Às vezes, entro e já começo a vomitar".
(Bukowski)

Nunca li nada de Bukowski, mas algumas trechos sobre sua biografia me interessaram de modo comprometedor (o modo que nos deixa com o desejo de conhecer de fato). Penso que é uma certa mania esta o despertar da paixão pelos malditos, os que ficam bêbedos e são livres.

Tive o mesmo sentimento quando li sobre Rimbaud, Ginsberg, os hippies e a juventude de 1968. Trata-se do estranho anseio de ser livre. O mesmo também sinto por Sartre. Mas, com sinceridade, penso que sou semelhante a Proust, a Fernando Pessoa, a Drummond. Eu sou acanhado. Decerto, é muita pretensão ficar nessa tentativa de comparação a grande escritores. Na verdade, é um costume dos meus treze e catorze anos quando à noite eu sentava na mesa da cozinha e imaginava uma reunião de poetas famosos. Um sarau de malditos, uma sociedade de poetas. Eu ficava por horas recitando poemas.Em falta de uma sociedade real de poetas criei a minha própria, inventei os meus próprios poetas-personagens: Eva, Catherine Marie, Ernesto López, Franz Eddie e Lazzaro Borges.

Quando li que Bukowski adorava os bares lembrei de Ernesto e do Livro da embriaguez, que estou escrevendo vagarosamnete desde 2006. Apesar de vê em Ernesto uma aproximação com Álvaro de Campos, Mário de Sá Carneiro e Rimbaud. Num poema de Ernesto ele afirma que seu deus é Álvaro de Campos. Porém, agora aparece esse puto.

Enfim, maldito velho safado (Bukowski) nos falaremos. É verdade que será uma relação de inveja, já que sou um tímido rebelde tímido.



Av. Sapopemba - dezembro 2007 (por Rudinei Borges)



...esta casa amarela entre outras casas amarelas. O horizonte infindo é um concreto vago. Se pudéssemos comê-lo sentiremos um gosto amargo. Tudo nesta manhã é amargo. Menos o manequim dos biquínis roxos e a escada rolante vagarosa e rolante. Hoje, sou isto, amanhã aquilo. Não, eu sempre fui isto: um almoxarifado. O silêncio de domingo, o sino. Aquela senhora, interessante senhora do Ipiranga, ela come as unhas e o cabelo foi penteado às pressas. Aquela senhora olhou para mim. Não gosto que olhem para mim. Que olhem para as paredes, para o teto. Olhar para mim? Ah, que desperdício de energias. Um espelho? Para que serve um espelho quando não queremos olhá-lo? Talvez para recordar que um dia debaixo da porta houve uma carta e que as chaves são semelhantes aos chifres de Lúcifer. Um dia vi Lúcifer. Mas Lúcifer é imbecil e poeta. E eu não gosto de poetas. Aliás, o que tenho feito, senão odiado este recital trágico. Meu caro, Jude, a vida é perigosa como estas estátuas. Não duvide. Este homem que lê, ler a si mesmo vagarosamente e amanhã deixará a saliva sobre os espectros. E este homem que escreve deitou-se com as algemas. Esta casa amarela. Meu Deus! Se você olhasse para mim. Mas não gosto que olhem para mim. Desconfio de mim que não durmo. (Por Rudinei Borges - 15 de junho 2008)




terça-feira, 17 de junho de 2008


Janeiro 2008 (por Rudinei Borges)
Poema de Rudinei Borges (por Ernesto López) na voz de Alexandre Ferreira.


Casa de Sidnei Vares - janeiro 2008 (por Rudinei Borges)


07 de junho 2008

Faz tempo o mundo não é o mesmo.
Nasceu uma espécie estranha de flor no jardim de minha casa.
Mas em minha casa não há um jardim.
Faz tempo eu olho para os edifícios desta janela
E, desta janela faz tempo, não vejo nada. Nem o nascer do dia.
Eu era abrupto. Como uma pedra. Eu era abrupto.
E quis casar com minha mãe.
E quis casar com meu irmão.
Eu era abrupto. Não mais que o bronze daquela estátua de anjo.
Eu amei aquele anjo.
E amei um menino louro que fotografava estátuas de anjo
Num cemitério.
Faz tempo eu não amo.
Nem este palhaço sobre a escrivanhia. Ele rir um riso estático.
Faz tempo eu não rio.
A Sra. Ema está correta. A esta hora as mulheres de respeito
Estão dormindo. A esta hora os homens de respeito estão dormindo.
A esta hora a porta da rua está fechada.
Agora, o que resta?
Cento e tantos livros. Um bíblia.
Eu li Cântico dos cânticos.
A esta hora Jesus cristo deve está no céu com os anjos.
O que Deus deve está fazendo a esta hora?
Faz tempo eu não penso em Deus.
Vou dormir.


Rudinei Borges (por Ernesto López)




Últimos galhos - dezembro 2007 (por Rudinei Borges)



16 de junho 2008

Tenho saudades de ti que não vens. Tenho saudades.
Mas nada é preciso quando a urgência é o anúncio
Amargo do fracasso.
O frenesi do opaco é irredutível.

Gosto de mim que sento nas escadas
Como quem esperasse. Gosto de não sentir sono.
E mesmo quando há felicidade as artérias estão cheias de vazio.
Não sou feliz. Não poderia ser feliz.
Amanhã o sol nascerá e terei que dizer aos homens
Que o meu estômago é igual ao deles.
Terei que proclamar aos espectros
Que a minha sina é uma arca corroída por cupins.
Mas não tenho coragem.
Terei que mentir.
Aliás, a cada manhã minto como um vagabundo ordinário.
Mas gosto de viver para poder contar as horas.
Quando o padre vier pedirei perdão.

Eu respiro como as mariposas.
Eu respiro como os mosquitos.
Eu respiro como os cavalos gregos.
Eu tenho ânsia como as rãs.
Eu sou um macaco.

Gosto de ser um macaco como gosto de não sentir sono e viver.
Gosto do gosto da saliva daquele arquiduque.

As minhas mulheres cometem adultério.
Tudo é tão tenebroso.
Tenho medo de você ir e nunca mais voltar.
Deixe-me.


Rudinei Borges (por Ernesto López)

sábado, 7 de junho de 2008