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sexta-feira, 24 de outubro de 2008





Ele estava sempre conosco e era tão alegre, tão cheio de vida. Não conhecíamos ninguém igual a ele. Ninguém mesmo. Mas depois de um tempo ele foi para longe. Não sei exatamente onde, mas sei que era distante. E não sei o que foi feito dele, não soubemos mais nada a seu respeito. Nada mesmo. Uns dizem que ele nos abandonou, que cansou de tudo isto aqui. Mas quase todos na aldeia acreditam que ele morreu, porque sabem que se ele estivesse vivo não suportaria ficar distante de todos aqui. Não, ele não agüentaria, porque nos amava de uma maneira estranha, diferente. Ele nos amava de um modo que sabíamos que verdadeiramente nos amava. E não podíamos duvidar disso. Ninguém ousava duvidar disso. Por isso, cremos que ele morreu. E por ele ter morrido sofremos e choramos, porque estávamos longe quando ele mais precisou e sequer podemos nos despedir. Por que o senhor vem, agora, relembrar esta história? Decerto, o senhor não sabe o quanto a saudade que sentimos nos faz sofrer. O senhor nem pode imaginar. Por que o senhor nos envolve com suas dúvidas? Eu já o havia esquecido. Porque esquecê-lo foi o melhor remédio que encontrei para não mais sofrer com a notícia de sua morte, posto que se até ele morreu... o que acontecerá conosco? Agora, o senhor com seu atrevimento nos faz recordar o quanto sofremos com o que aconteceu. A lembrança dele é dor e ninguém deseja dor. E sentimos dor quando o recordamos, porque não o amamos com a mesma intensidade que ele nos amou. E todos sabem e todos se ressentem. E ele se tornou para nós um ressentimento. E por sua causa sentimos outra vez o mesmo ressentimento. O senhor não tem esse direito. O senhor fala dele como se soubesse que ele está vivo, como se tivesse tanta certeza. Mas o senhor não tem nenhuma. O senhor apenas brinca com a nossa dor. Sei muito bem que o que sofremos com essa história é motivo para seu divertimento. O senhor deveria pensar duas vezes antes de nos perguntar sobre Deus, antes de afirmar qualquer coisa sobre ele. Nós o conhecíamos muito. Não queira nos dizer o que sabe de Deus. Nós sabemos melhor que ninguém que ele não nos abandonaria, não nos deixaria a esmo. Deus jamais faria isso. Sinto-me incomodada até em pensar essa possibilidade. Como o senhor tem coragem? Espero que isto não chegue aos ouvidos de nossos avós. Eles ficariam ofendidos. Extremamente ofendidos até. E ofendê-los é como se o senhor e seu ajudante ofendesse toda nossa aldeia. Não ouse.

Aperto, esboço de um romance





O romance em primeira pessoa conta as alucinações e devaneios de um homem que mora sozinho em um apartamento. Ele cola catálogos na parede e observa as pessoas pela janela; inventa histórias para essas pessoas, conversa com seus personagens e com personagens de outros romances, como os de Kafka; conversará com Gecor Samsa de “A metamorfose”, com o jejuador do conto “Artista de fome”. Também terá conversas com Eutanázio, personagem de Dalcídio Jurandir no romance "Chove nos campos de Cachoeira". Os três são homens doentes e ele cuidará deles. Tratará de suas doenças. Todos os personagens com quem conversa estão próximos da morte. É um romance, de certo modo, sobre a morte e o fardo de existir.

Este homem não tem nome. Ninguém sabe quem ele é, sua biografia. O romance é uma narrativa sempre movimentada. No fim ele estará cansado do aperto do apartamento, do aperto existencial e verá as paredes o engolirem. Os livros, os catálogos que ele coleciona o engolirão.

O homem moderno vive em um aperto, a vida é um aperto.

(São Paulo, 20 de fevereiro 2007. Sentado de frente de uma janela aberta para a rua Cipriano Barata, Ipiranga. Estava sozinho e olhava os pedreiros reformando uma casa).



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O disco movimentando-se. O disco e a voz do poeta movimentando-se no gramofone. Meu Deus, o gramofone é velho e sou tão jovem aqui sozinho. Por Deus, tão velho, como o gramofone de um médico, sento-me sozinho no sofá da sala. E a voz do poeta sonora e triste quase some. Não, não sou eu que estou surdo. É a voz do poeta que é fraca. O poeta é fraco, é um homem franzino, desses que não se dá um pedaço de pão velho. Mas a poesia dele é grande. E ele invade a minha sala, senta-se sozinho comigo no meu sofá. Não é a voz do disco no gramofone que fala, é o poeta que veio, nesta tarde, recitar para mim os seus poemas. Mas o poeta é velho. Meus Deus, ele até rir. Mas ele é triste. O poeta é triste. E o que menos quero é a tristeza, porque já a tenho suficientemente. E o disco movimenta-se, a voz do poeta sentado movimenta-se com os homens fora da janela derrubando a parede de uma casa velha. Vão construir uma casa nova, uma vida nova. O pedreiro olha uma mulher que passa e rir. O pedreiro rir. Meu Deus, o pedreiro rir. E o disco no gramofone pára, os automóveis param e todos, agora, ouvem a voz franzina do poeta franzino, recitando pessoalmente um poema franzino. E olham todos para a minha janela e me escondo, não quero ser visto. Não quero que saibam quem mora no andar de cima da casa mil nove centos e catorze. Não quero, não podem me ver. Que vejam o poeta, mas ao não a mim. Que ouçam o poeta, pois sou mudo, pois sou invisível, pois sou triste. E as ruas fazem silêncio, os gritos findam e todos querem ouvir aquela voz franzina recitando um poema sobre o mundo. Aquela voz que é minha, que veio para mim, para compartilhar a minha velhice e a minha tristeza. Mas não sou triste, sou apenas um homem sozinho. E a minha casa está cheia. E cheia a minha casa é solitária. E cheio sou distante. Desligo o gramofone, guardo o disco. Não quero aquele poeta aqui. Perdoem-me, mas tenho de fechar a janela. Não quero que vejam nada desta casa. Deixem o poeta recitar apenas para mim os seus poemas. O poeta é meu. Não posso dividí-lo. A mulher voltou-se para o pedreiro e, agora, a mulher beija o pedreiro. A mulher ama o pedreiro, a mulher terá muitos filhos com ele. A mulher será feliz. Eu sei que eles serão felizes. Não me proíbam de dizer que eles serão felizes e que um filho deles será um poeta franzino, de voz franzina e será meu amigo (meu grande amigo) e, por vezes, entrará na sala de minha casa, sentará no sofá e recitará para mim poemas sobre o mundo. Sim, é o filho do pedreiro e da mulher que passa na rua que, neste instante, recita para mim um poema e faz crê que posso rir e faz rir os meus enfermos. O menino cresceu, o menino cresceu e não quis ser pedreiro como o pai. O menino é poeta e é triste e é sozinho. O menino mora sozinho no andar de cima de uma casa, o menino olha por horas sem fim as pessoas passando na rua. O menino não tem mulher, não tem filhos, não tem amigos. O menino mora sozinho. O menino é sozinho e por isso veio à minha casa recitar um poema para mim. Um poema sobre o mundo. Um poema grande como o mundo. E as pessoas querem escutá-lo, mesmo que ele seja quase mudo, inexpressivo. O pedreiro me convidou para o casamento, mas não quis ir, não posso ir. O que vou fazer em um casamento. Não gosto de casamentos. Casamento é a única coisa que me faz rir. Não posso rir do pedreiro. Seria cruel. E não gosto de ser cruel.

Hoje, a mulher passou na rua e de novo o pedreiro olhou para ela. E riu. Ela olhou para ele. Ela riu. O pedreiro trouxe uma flor franzina, vermelha como a tarde. Mas a tarde não é vermelha. O pedreiro deu a flor para a mulher e ela foi embora. A mulher veio a minha casa.Como? Não posso, eu não posso recebê-la. Não conheço esta mulher. Desculpe-me a ousadia, mas somente o senhor pode dizer o que realmente devo fazer. Não faria nada sozinha, não saberia. Não finja que não me conhece. O senhor me conhece mais que eu mesma. O senhor sabe que sou uma jovem viúva e há anos procuro livrá-me desde véu de penúria, deste luto. E que não agüento mais suportar o espectro do meu falecido marido sobre os meus ombros. Que as pessoas não sabem que sou viúva isto é certo. Mas que a viuvez me distancia das pessoas isto é mais certo ainda. Quero somente _ e o senhor entenderá, porque o senhor é o homem mais inteligente que conheço_, reivindicar o direito de ser feliz. Não que o senhor tenha me negado isso, mas que o senhor anda demasiadamente ocupado e não tem lembrado do meu caso. Há anos tenho tentado fazer com que o senhor se lembre de mim. Há um tempo descobri onde o senhor mora, mas não ousei vir a sua casa, sei que o senhor não me receberia, como não recebe ninguém há anos, somente os seus enfermos. Sei que o senhor é um homem generoso. Falam nas ruas que o senhor tem amado Gegor, que o senhor tem tratado da doença deste pobre homem como um pai. Tenho passado na sua rua há meses, mas somente quando o pedreiro olhou para mim o senhor percebeu. Recorde-se, sou a viúva de um dos Buendía. O seu esquecimento tem me condenado ao sofrimento e a solidão. Permita-me casar com aquele jovem pedreiro, permita-me amá-lo e ter muitos filhos com ele. Não reivindicarei mais nada; peço, que após tanto sofrimento, o senhor me recompense com um tanto de paz. Nada mais do que o que eu mereça. Apenas o necessário. Alguns dizem que o senhor tem feito justiça, mas sei que o senhor não gosta do termo justiceiro. Contudo, sabemos o que o senhor pode fazer, então faça algo por mim. O meu pedido é reles, menor que de outrem. Não peço riquezas, nem prestígios. Não peço grandezas. Peço somente para viver, por um tempo que seja, este amor. Sim, que o senhor depois resolva finalizar a minha existência ou a de meu amado, mas antes que isto aconteça, permita-me primeiro experimentar, por um instante, o amor deste homem. Que o senhor é um homem amargurado todos sabem, mas não temos a obrigação de sofrer porque o senhor sofre. Ninguém diz isto ao senhor, mas tomei a liberdade de dizer: o senhor tem me feito sofrer com suas neuroses e esquecimentos. Que o senhor é apático, um escritor fracassado, que nenhuma mulher olha para o senhor, que a sua vida é colar catálogos nas paredes do seu apartamento... isto todos sabem. Que temos com isto? Não iria dizer, mas, agora, sinto que devo dizer a verdade: não sei de outra pessoa que tenha nos feito sofrer tanto. Que o senhor prefira a escuridão desta sala... estes móveis empoeirados... mas deixe-me ser amada por aquele pedreiro. Deixe-me ser acariciada por suas mãos, deixe-me fazer sexo com ele. Deixe que ele construa uma casa para mim e nossos filhos. O senhor não tem o direito de impedir isto. Não, não tem.

Texto experimental




Aviso: Não pensem que eu tenha esperança de que alguém lerará todo o texto. O propósito aqui é muito mais documentar o experimento que pode ser ou não usado no "Livro da Embriaguez".


... não não não (Pouco sei do que dizem. Eu espero. Mas creio nos que falam de amor com esperança. Eu amo. Mesmo sendo o amor uma construção vaga. Eu amo. À tarde eu sempre pedia esperança aos homens. Esperem! Esperem! Esperem! Ele apenas dorme. Eu gosto dos que dormem. Mas tenho medo dos que dormem demais. Ele haverá de acordar. Vocês não podem ir antes que ele acorde com seu humor, com seu riso. Gosto de quando ele dá longas gargalhadas e conta histórias de festas antigas, em que as mulheres usavam máscaras. Fiquem, por favor. Talvez ele acorde inspirado e recite para nós um de seus poemas. Ele tem poemas de beleza infinda. Afinal, ele é... Esqueçam! Há algum tempo atrás, logo quando vim ajudá-lo na biblioteca, ele se sentou na escadinha que vai para o quintal e ficou por horas recitando poemas que ninguém por aqui conhecia. Era de um livro antigo. Foi numa tardinha de outono. Uma tardinha ensolarada, aliás as tardes por aqui são sempre ensolaradas, até no inverno. Talvez por isso ele vive repetindo que o sol mora aqui, em nossa aldeia. O fato é que ele ficou por horas olhando para uma fonte que havia no quintal e nos chamou para sentar com ele. Não pensei que ele fosse deixar seus afazeres para sentar-se conosco. Imaginava que ele era demasiadamente ocupado para o ócio. Mas ele amava o ócio. Assim, tinha tempo para todos. Hoje, pergunto-me com uma certa dor (não sei se dor é a palavra certa): por que ele ficou aquela tarde inteira recitando versos que tampouco sabíamos o significado? Tudo o que ele nos dizia era tão próximo do que é a música. Mas que é a música? ... Não não não. Não me perguntem! Eu não sei. Depois ele nos trouxe chá. Ele adorava chá. Mesmo no calor ele adorava chá. Não entendíamos nada, nem tínhamos razões para entender. Afinal, ele é... Esqueçam! Peço somente que esperem. Talvez um pouco de chá vai acalmá-los. Eu vou buscar. Aqui lemos os livros sempre com uma xícara de chá sobre a mesa. Não estranhem este nosso gosto desajeitado. É o nosso costume.




Tenho nojo das xícaras. Meu Deus, ali o que tínhamos? Aquelas xícaras foram compradas com o dinheiro que ele nos enviou, mas este tal dinheiro nunca chegou a nossas mãos. Como posso lembrar aqueles ladrões? Talvez as crianças nunca vão compreender o que ocorre com os adultos. O chá sempre foi servido numa garrafa marrom. Queimava a boca. Como tudo naqueles dias queimava a boca e o resto do corpo. Aquele chá, aquelas xícaras deixaram feridas enormes. E tenho levado pela vida inteira o gosto amargo desses chás. Por Deus, odeio chá! Não venham com considerações absurdas. As moças da Formosa não vão entender. Deixe apenas a saliva escorrer sobre minhas costas. Quero sentir a saliva quente queimar a minha pele, a minha boca. Não venha. Aquela velha miserável. E nem tenho argumentos para odiá-la. É só uma lembrança. Agora, reflito. E misturo um pouco de água e sexo. Uma vontade imensa de sentir prazer sempre. Um tanto de tristeza com sono e vontade de ir ao banheiro e lavar o rosto. É como uma vontade imposta, shoperaueriana, como se não fosse possível escolhê-la. Quase um sentimento ambíguo. Soube anos depois que a velha morreu e senti saudades. Por nada. Decerto, pelo o que não foi. Irremediável desgraça: sentir afeto por tudo que não foi. É detestável saber que não me entendem. Paciência. Se vocês esperassem eu até contaria. Odeio aquela velha por tudo que ela poderia ter sido, conforme as minhas expectativas, mas não foi. E o que sei agora? Ela sobrevive em pequenas lembranças. Minúsculas é o melhor termo. Aquela velha de merda. Desculpe-me: não é minha intenção acusar as velhas. Não nos engane. Não tenho tempo algum. Estou quase próximo do fim e você exige que eu espere. Sabe, ele não ama o ócio. Está claro: ele ama o descaso. Se ele dorme é porque não quer falar conosco, pois deve saber que estamos aqui, que temos pressa. E, assim mesmo, permanece dormindo como se estivesse cansado. Cansado de quê? Penso que os poemas que ele recita não devem cansá-lo mais que a amolação dos viandantes. Não. Não queremos o dinheiro que ele nos enviou. Mande estas moedas podres para o inferno se ainda existir inferno. Ah, decerto, vocês deram para ele a melhor cama da aldeia. Oh oh oh. Mande o seu senhor para os diabos. Destarte, ele encontrará o que fazer.



Era uma saudade permanente. Íamos àquela casa somente quando alguém morria. Era comum que nos encontrássemos diante dos mortos. Meu Deus, eu tinha vontade de ser como eles (não como os mortos). Como os vivos daquela casa. Vontade de cruzar os braços e fumar cigarro como os homens e sentir dentro do corpo a velocidade de um automóvel. A morte estava lá. Sempre a morte deitava-se ali. Eles morriam cedo, enquanto o resto do mundo envelhecia. Enquanto as mulheres rezavam com os filhos. A morte era uma triste amiga. Sempre tive muito medo de morrer. E ainda estou vivo para vê-lo acordar. Os mortos ficavam misturados com a desordem da sala, da cozinha. Com as roupas do quarto. A televisão ligada o dia inteiro exibia-se para as paredes. Eles comiam como leões. Os mortos estavam sobre a mesa, entre os pratos. Eles comiam também os mortos e riam e riam e riam. Para que rir? Vi o velho morrer dia-a-dia, o velho apodrecer a esmo no piso da varanda. E vi aquilo como se a morte fosse o pagamento de suas misérias. E sentia alegria de vê-lo morrer, de vê-los todos morrerem. Perdoe-me: é, deveras, forte admitir isto. E sentia como se aquela casa foi um grande túmulo sem epitáfio.



Ele deitou sobre a cama como se tivesse cansado do seu próprio silêncio e esperou que ela também se deitasse. Quando ela veio e desligou a lâmpada ele tirou a faca que estava sob o travesseiro. Depois de matá-la ele se suicidou. Não vimos os corpos. Não houve coragem entre nós.



Tenho grandes esperanças. É algo até agradável. Tudo indica que não retornarei àquela casa. Há lugares que jamais retornarei. E há outros pelos quais sinto forte arrependimento de não ter ido. Algumas camas esperam para que eu durma nelas e deixe um tanto dos meus pesadelos ou do meu implacável desejo. Não condenem o sexo. Que tenho feito com as mãos? Durmo sempre à espera do outro corpo que virá com suas ternas carícias. Tenho pena de mim que não tenho nada. Não tente me depreciar. Não não não. Só espere. Fiz de mim uma miragem. Já morei em muitas casas. E já vi muitas janelas. Se eu morresse agora seria apenas um contratempo biológico. É cedo para que eu morra ou me mate. Por vezes, receio me matar antes da hora. O suicídio é um ritual. É em vão. Esta coisa de querer ser grande me atormenta. Dor amarga esta, a posteridade: um fragmento.



Ela me levou para o quarto e ordenou que eu ficasse calado sobre a cama e me fez sentir cócegas nas pernas. Tenho esperado de modo exagerado e penso. Ela me deixou nu e acendeu treze lâmpadas no quarto. Ela conhece o meu corpo mais que eu. Quando acordei ela trouxe chá numa xícara branca e sentou ao meu lado meio inquieta, rasgou algumas páginas do livro e enxugou o suor do meu rosto. Ela me beijou e me fez sentir frio. M. tem mania de ser misteriosa.


O que tenho agora? É esta vontade de dormir um pouco, de ficar quieto na cama para que ninguém perceba que estou em casa. Não sinto vontade alguma de falar com quem quer que seja e quando o telefone toca é como se um sino tocasse desesperadamente dentro de mim. Tenho vontade de desligar tudo e ficar quieto dentro da minha própria escuridão. Tenho medo de amar como as mulheres amam. Sim, é quase certo afirmar que faz muito tempo que não escrevo, nem telefono. Você repete, como se fosse uma verdade, que me tornei incomunicável. Não é tudo isto verdade, como não é verdade que eu os esqueci. Como poderia esquecê-los? Não sou tão pretensioso quanto pareço e, por mais que aparente estar distante, devo, com certeza, está presente nas conversas de todos. Devo dizer, com efeito, que sou eu que tenho me sentido solitário. Talvez por desejo próprio, mas a solidão de agora não é muito diferente da solidão que eu sentia quando morava com vocês ou quando estive em outras casas, morando com várias pessoas. Tenho impressão que eu me sinto solitário desde que nasci, o que não é nenhum mérito para mim. Não é mesmo nenhum mérito a tristeza. Mas apenas descrevo o que sinto e você, decerto, entenderá. Tenho também a impressão de que você é a única pessoa capaz de me entender, porque talvez isto que chamam de alma seja algo em nós muito parecido. Penso que adentrei definitivamente em um estado ardente de vazio, como se não tivesse nada para dizer que fosse, de fato, interessante, isto é, que me desse prazer de compartilhar. Penso que me tornei um homem seco, por mais que eu esbanje simpatia nas conversas informais, que mantenha um riso descarado no rosto, como se não houvesse tempo ruim. Eu sou uma farsa. Estranha para mim e para os demais. De repente tenho a sensação de que quanto mais procuro mais estou distante. Assim, tento inventar atividades amenas que me permitam sentir prazer, pelo menos numa pequena parte do tempo. Acho mesmo que guardo uma dose razoável de criatividade dentro do meu peito, com isso agüento o peso dos dias. Eu engano. Meu Deus, como estou me tornando um gênio na arte enganar (se isto for arte). Talvez eu consiga o grande feito de enganar a própria morte.





Quando pensei em escrever esta carta acreditei mesmo que escreveria algo grandioso, ademais não há momento em que eu não aspire a grandiosidade. E, por isso, eu sei, tenho tanto medo. O que não é novidade quando o que encontro em minhas andanças são pessoas medrosas. Porém, elas fingem. Como grandes atrizes elas fingem uma coragem extraordinária. Aqui, a cada palavra, sou tão parecido com o Sr. Ernesto López, o que é complexo, porque o meu fingimento chega a ser doentio. O Sr. Ernesto se suicidou a pouco tempo deixando comigo um túmulo inumerável de poemas. Mas ele era um homem corajoso, tanto é que amou com o próprio sangue, a ponto de escolher a morte. Não fique espantada com o que digo. Talvez um dia você entenda, ainda que não adentre o meu peito podre. Vou contar para você o que nem eu tenho certeza que sei de mim. Suponho, então.



Tentarei não fantasiar o que já é demasiado alegórico. Desde que vim para cá tenho sofrido. Saiba, não estou exagerando quando afirmo que tenho sofrido. E você, decerto, está me reprimindo: volte, então, para cá. O fato, minha irmã, é que não encontrei, até então, nenhum lugar que me fizesse feliz. Porque não são os lugares que determinam a minha felicidade. Sou eu que não consigo me sentir em paz em qualquer parte que seja, é dolorido o peso que me foi imposto, ou que eu me impus. Perdoe-me: não farei uma elegia à vida. Não espere que eu cantarole as esperanças, que exalte o que quer que seja. Não tenho olhos para o sublime. Na verdade, até hoje tento entender as aulas de Estética quando não tenho sono, isto me faz dormir. Com franqueza, não gosto de minha amargura. O meu vazio é resultado do meu cansaço. Chego ao fim do dia como se chegasse ao fim da vida. Vivo exausto. E já comecei a usar remédios para me sentir menos cansado. Compro numa farmácia aqui perto. Não é caro.


Lazzaro: Ali havia uma ponte. Acho que era uma das maiores da cidade.
Ernesto: Onde?
Lazzaro: Olhe, logo atrás daquela árvore da pracinha. Está vendo?
Ernesto: Ah... acho impossível que tivesse uma ponte ali.
Lazzaro: Pois acredite. Havia uma ponte exatamente atrás daquela árvore da pracinha, onde está passando, agora, aquela mulher de saia azul.
Ernesto: Sim, mas por que você lembra esta ponte com tanto entusiasmo?
Lazzaro: Meu caro, Ernesto, acredite foi graças àquela ponte que hoje estou aqui com você.
Ernesto: Gosto do seu tom esperançoso. Como isto aconteceu?
Lazzaro: Meu amigo, não aguentava mais aquele sofrimento interminável. Eles mataram muitos homens do partido... Como tudo por aqui mudou...
Ernesto: Ainda bem! Nunca andei por este lado da cidade, mas acho tudo por aqui um tanto triste.
Lazzaro: Eles acreditavam que eu era do partido e você sabe que nunca fui de partido algum. Eu apenas cria, como creio hoje, que o mundo, seja como for, poderia ser mais justo.
Ernesto: Você realmente crê?
Lazzaro: Por Deus! Você sabe que eu creio.
Ernesto: Você foi preso...
Lazzaro: É verdade! Foi lá que me prenderam, onde fica aquela pracinha.
Ernesto: aqui realmente mudou: não imagino uma prisão naquela praça, nem uma ponte.
Lazzaro: Não era uma prisão, isto é, não era oficialmente uma prisão. Era uma casa muito bonita. Ficamos presos, eu e os homens do partido, dentro do porão.
Ernesto: Dentro do porão? Que criativos. Como se não tornassem a nossa vida, mesmo aqui fora, um porão escuro.
Lazzaro: É... Havia uma janela, de onde entrava ar e luz. O que seria de nós não houvesse isso. Da janela podíamos vê a ponte.
Ernesto: Que tem a ponte?
Lazzaro: Durante meses a única alegria que eu tinha era olhar aquela ponte e vê, por vezes, o pequeno rosto das pessoas passando. Eu já havia esquecido como era um riso.
Ernesto: E como é um riso? Eu não sei como é um riso.
Lazaro: Escute! Tente entender. Para mim foi importante.
Ernesto: É que não costumo vê pessoas rindo, nem nas ruas nem nas pontes. Nem nas praças.
Lazzaro: talvez você nunca vá entender.
Ernesto: o que, Lazzaro?
Lazzaro: ... um dia vi um menino se aproximar da janela e comecei a asssoviar como um pássaro.
Ernesto: Talvez porque você quisesse escapar daquela gaiola.
Lazzaro: É. Você está certo. Eu queria escapar como qualquer pássaro.
Ernesto: E o que você fez?
Lazzaro: Um dos homens do partido convenceu o menino que nos trouxesse uma serra. Mas tínhamos um pouco de medo, pois Eles não sabíam que aquela janela dava para a rua.
Ernesto: o menino trouxe a serra?
Lazzaro: Trouxe!
Ernesto: É esquisito... não sei o que faria se estivesse lá.
Lazzaro: Você faria o que todos fazem, mesmo quando não estão lá.
Ernesto: Eu sei...
Lazzaro: Todos queremos escapar de qualquer jeito.
Ernesto: De qualquer lugar, a qualquer hora.
Lazzaro: depois que fugimos e tive que acompanhar os homens do partido. Era a única alternativa.
Ernesto: Não havia outra, Lazzaro. Não se culpe!
Lazzaro: Tive que deixar o país, tive que deixar tudo que eu tinha. Porque Eles, Eles sempre estão entre nós com suas algemas.
Ernesto: E nos prendem de qualquer maneira.
Lazzaro: Eu sei...
Ernesto: Eles o matariam se você tivesse ficado.
Lazzaro: Não. Eles me mataram de qualquer modo.
Ernesto: Não diga isto, assim você se parece comigo. Onde andam as tuas esperanças? Você sempre foi tão corajoso.
Lazzaro: Não, Ernesto, eu é que sou covarde. Você está enganado. Com toda a minha luta, eu é que sou covarde. Pensei que poderia mudar o mundo. Enquanto você sempre soube que não poderia mudá-lo.
Ernseto: eu confio em você e nunca disse nada contra a sua luta, sempre tentei ajudá-lo.
Lazzaro: Não é isto. Não estou cobrando nada de você. Enquanto eu cria que lutava você amou. O que adianta tanta luta se quando mais precisamos estamos sós.
Ernesto: Não volte a esta história, por favor. É demasiadamente dolorida para nós.
Lazzaro O que não é dolorido para nós?
Ernesto: Nada... esquece...
Lazzaro: ela sabe que eu a amava.
Ernesto: Como queria que ela ficasse com você se você estva preso e só tinha tempo para a luta e a luta, a sua luta.
Lazzaro: não fale assim.
Ernesto: perdoe-me, irmão.
Lazzaro: você sabe o que é perder um amor.
Ernesto: Eu sei...

Não é possível que eu me assuste tanto. Eu tento a cada segunda-feira organizar o quarto, mas não há mais jeito. Sempre a mesa está cheia de papel e a cama está tomada de roupa meio suja. Só separo um espaço adequado para que eu possa descentemente dormir. Não é justo que eu não durma. Tirem tudo de mim, menos o tempo sagrado que eu reservo para repousar sobre a cama. É uma necessecidade animal esta de dormir. Não se engane. A cada momento, em que jogo sobre a cama este corpo humano, rogo, no fundo do peito, para ficar definitivamente no reino dos sonhos. Sabe, quando eu durmo é como se buscasse um campo distante, onde pudesse respirar com alívio. O meu sono é fuga. Acho enfadonho falar de mim. Depois de um ano, sinto-e como se olhasse para trás e não tivesse nada de especial para contar, como se estas perambuções fossem fúteis. Meu Deus, é engraçado como tenho me tornado um animalzinho rabugento. Bem, não sei de nenhum patrício que venha pagar minhas contas. Eu tenho contas. O animalzinho tem contas. Não reclame: o homem deve somente... esqueça! Tudo o que devo é para o sustento do corpo. Nada mais. Que tenho feito pelos outros? Agora, falaremos de compaixão. Interessante! Quando aperta a agonia, lembra-se, enfim, dos outros. Os outros sofrem menos que nós.



Depois de um dia a esmo, sento-me. O que você dirá disto? Não diga nada quando não há nada para dizer. Espere até que as palavras cheguem para ocupar o vácuo. Para que o caos pareça razoável e se misture a esta ausência de silêncio. Recolho-me e é certo que isto não interessa em nada. Estes caminhos e estes sobrados fascinam meus olhos como num filme. De repente, poderia, sem ressalvas, despojar versos e desabafos em voz alta quando caminho para o museu. Ernesto, o meu amigo, vai comigo. Por Deus, a esta hora, que é tarde, estou só. Esta é a pior doença: não encontrar pares para que ouçam nossas vis palavras. Devo dizer: que é o homem, senão um andarilho solitário. Não temos razões para o engano: com eficiência, tentamos nos agregar, como um bando, porém estamos sós, como na hora da morte. A morte é somente o momento culminante da grande solidão que foi a vida, que é a vida. Devo também dizer – e não sinto nenhum orgulho disto – estou morto. E, em nada, tomo distância destes ossos misturados com terra. Agora, pergunto-lhe: que sou? Este cemitério infindo meio à cidade? Estas cruzes e estes anjos tenebrosos? Pior, minha irmã, não sou nada. Nada que fique para a história como um grande monumento ou o nome de uma rua ou de uma praça. Não me lembro. Por Deus, por esta noite que cresce diante dos meus olhos, não me lembro de nada que me faça ficar por alguns anos diante dos olhos dos homens. Que resta? Às vezes, o que nos resta, deveras, é este silenciar da noite cálida, quando nem os fantasmas se lembram que existimos. Nem as estrelas se lembram.

Bilhete para Dom (Rafael Coelho)





São Paulo, 23 de outubro 2008

Minha luta agora é brava e cansativa. Depois de um ano e dez meses como professor de Filosofia, cheguei ao limite desta profissão (creio que parecerá desagradável se eu usar o adjetivo profissão infeliz). Não a Filosofia. Adoro Filosofia. Mas a profissão de lecionar que é um castigo, menos para o corpo e mais para a alma.

Admiro em mim a clareza de perceber aquilo que me faz mal. Deixei o curso de Psicologia e fui para o Jornalismo, que é um divertimento agradável. Agora, preciso dizer adeus a este trabalho desgastante - em alguns instantes penso que inútil também.

Cara, não é nada fácil mudar de emprego nesta selva, São Paulo. E sei que mais tarde terei que lecionar numa faculdade, afinal estou no mestrado em Filosofia e terminando uma pós em Comunicação e Mídia. É tanto curso e muito cansaço.

Por vezes, tenho vontade de ficar na casa do Dom paulistano (a sua versão aqui em Sampa) e fumar e cheirar todas. Aí vem aquela obrigação que me trouxe da Amazônia para cá: eis-me aqui para vencer. Não dá para mergulhar em ilusões alucinógenas. Sobre a minha cama há um monte de papel. Há 200 envelopes, mil folhas sulfites ...


Rudinei Borges

Conversa de Rudinei Borges com Felipe Garcia





"Eu celebro a mim mesmo, e o que eu assumir você vai assumir, pois cada atómo que pertence a mim pertence a você". (Walt Whitman)



Felipe Garcia: Os gregos e os latinos tem muito que nos ensinar sobre a clareza das coisas. A poesia não é essa força esmagadora de uma forma, essa coisa descontrolada em que o poeta não sabe o que está dizendo. Um grito, em um poema, é tão suave como um volante hidráulico (sem futurismo!). Meu caro Borges, eu já vejo em sua poesia certa clareza e liberdade, principalmente em Ernesto, e fico muito feliz por isso. Eu estou desenvolvendo os versos nesse processo eterno de tentar buscar o íntimo das coisas livre de qualquer compreensão ou conhecimento de mundo. Poeta, não grite às alturas os teus versos, viva-os.


Rudinei Borges: Gosto do teu dizer. De fato, os gregos e os latinos tem muito que nos ensinar sobre a clareza das coisas. Não sou um poeta panfletário. Sigo apenas os meus mestres: Pessoa, Whitman, Eliot, Bukowski, Rilke e Lorca. Talvez eu tenha lido de mais estes caras. Parece-me que você e eu, porém, ainda não abraçamos a poesia pós-moderna de Leminski, por exemplo. A poesia visual. Você precisa conhecer "Folhas de relva" de Walt Whitman. Aí deveras entenderá a linha poética que sigo. Não sei e não consigo ser cerimonioso como os gregos e os latinos. Mas não sou panfletário.


Felipe Garcia: Ah, eu te compreendo, Borges! Realmente não é um panfletário. Eu conheço alguns poemas de Walt, sou sincero em dizê-lo, mas meu conhecimento da obra dele ainda é muito pequeno. Irei dar uma olhada melhor na obra dele. Sempre tenho esse olhar para frente, sem esquecer os grandes, tentado mudar alguma coisa, não sei. O caminho é certo, e o destino o fará. Até mais!
Avise-me quando você vier, assim eu planto no jardim as papoulas vermelhas que prometi faz tempo.

Avise-me e pintarei a casa, arrumarei a cerca e lavarei o chão.

Não. Não avise. Venha e terei certeza de que tudo isto será feito.


(Madrugada do dia 25 de outubro 2008)
Perdoa-me, por vezes.
Perdoa-me que o perdão é um sentimento vigoroso.
Perdoa-me, mas morde os meus lábios
E arranha as minhas costas.
(Tarde de 24 de outubro 2008)

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Para Ernesto López


(Por Rudinei Borges. Pintura em muro na Zona Leste de São Paulo. Autor anônimo. Dezembro 2007)

Naquele dia triste, peguei na mão de Ernesto,
Pedindo-lhe que me guiasse para um caminho
Correto, justo e honesto.
Ele me disse: “vai, segue sozinho,
O único caminho que há
É o meu protesto”.


Poema de Felipe Garcia, poeta do Rio Grande do Norte

sábado, 18 de outubro de 2008

Para Caio e Felipe






Que venha a morte maldita com
A traição tardia, com
Os cajados cálidos, com
O sussurro vago das paixões findáveis, com
Os violeiros do calvário, com
A cantoria triste das mulheres.
Que venha a cruz.

Que venha a agonia estéril, o
Asco dos soldados, o
Suor dos viajantes, a
Dor amargurada das mães.
Que venha a cruz.

Que venha a
Espada, a
Lágrima acre, o
Cântaro de vinho, o
Lenço, o
Manto, o
Ardor, o
Espinho.
Que venha a cruz.

Que venha o
Pássaro diante do sol, a
Tempestade crua, a
Terra árida, a
meretriz afoita, o
Galo (sem adjetivos).
Que venha a cruz.

Que venha Hitler, a
Mãe e o pai de Hitler.


Que venha Judas - terno e compadecido.
Que venha Judas como veio Heitor.
Que venha a cruz.

Que venha a
Minha mãe, os
Meus irmãos e o meu pai.

Que venha o
Meu amante, o
Meu patrão, o
Meu algoz.
Que venha a
Minha mãe.
Que venha a cruz.

E que venham os
Meus mortos, os
Meus vivos, os
Meus tataravôs e a
Srta. Rosângela, minha tia.

O
Jovem Thiago, meu primo.
Os
Parentes que não conheço,
Os
Parentes que odeio.

Os meus amigos e os meus inimigos.

Que venha a
Moça morena que amou o
Meu corpo e a
Minha alma às margens de um rio.
Que venha a cruz.


Que venha o
Meu filho e a
Minha filha.

A minha mulher e o meu marido.

O
Meu relógio,
Os
Meus discos,
Os
Meus livros,
A
Minha cama,
O
Meu diário.
O
Palhaço pequenino
Que eu trouxe duma viagem à Paraty em julho de 2007.
Que venha a cruz.

Que venha D. Quixote e Sancho Pança,
O menino Alfredo e Eutanázio,
A Sra. Amélia Lages e a Sra. Zizi Teles.
Que venha D. Rosalva Borges,
A Sra. Alzira e o Sr. Moacir Dias.
Que venha a cruz.

Que venha o diabo vestido de poeta
Ao lado de Ignacio Sánchez Mejías e Zaratustra.
O Sr. Freud, o Sr. Marx, o Sr. Nietzsche:
Que eles carreguem a cruz.

Que venham as ovelhas, os pastores, os elefantes,
Os trapezistas, os macacos, as cadelas no cio.
Que venha a Srta. Princeza, minha cadela morta.
Que venha Beethoven e Marcel Marceau.

Que venham com
Mísseis e bandeiras, com
Aviões e automóveis, com
Telefones e computadores, com
Gaitas e gramofones.

Que venham com
O crepúsculo ardendo nos olhos.
Que venha a cruz.

Que venham descalços e nus
Para chorar a morte do Cristo Jesus.

(Ernesto López)

14 de outubro 2008
São Paulo, SP
Quarto do sobrado no Ipiranga, à meia noite e quatro minutos.

Dentro do corpo



"A mim, a solidão não incomoda... detesto quando me roubam a solidão sem me oferecer verdadeiramente companhia..." (Nietzsche)


Queria todos os tóxicos dentro do meu corpo.

Dentro do meu corpo todos os cânceres.

Dentro da minha boca a saliva de Leonardo Da Vinci.



(Ernesto López)